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Análise 'El País': ministério de Temer não corresponde aos anseios do povo

Os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, da Saúde,
Ricardo Barros, e do Planejamento,
 Desenvolvimento e Gestão,
 Romero Jucá (Foto: José Cruz/ Agência Brasil
)

Sua escolha de ministros se choca com os anseios que são consenso mínimo na sociedade brasileira e não contribui para a descompressão da polarização política. Temer parece estar desconectado do Brasil de 2016.

Sempre se descreve Michel Temer como conciliador e com trânsito no Congresso. A segunda parte é precisa: basta ver o gabinete povoado por ex-parlamentares que apresentou. A primeira não tanto: o mesmo conjunto de ministros põe em xeque a intenção do presidente em exercício de “pacificar” o país, uni-lo em torno de um Governo de “salvação nacional”.
Com esse novo ministério, com quem exatamente o peemedebista se mostra disposto a conseguir acordos? Sua escolha de ministros se choca com os anseios que são consenso mínimo na sociedade brasileira e não contribui para a descompressão da polarização política. Temer parece estar desconectado do Brasil de 2016.
Numa análise apenas superficial, vários aspectos se sobressaem. O grupo de ministros é exclusivamente masculino, de meia idade, majoritariamente branco. Contém três nomes investigados na Operação Lava Jato e um ministro da Justiça que não se constrange em expor sua restrita visão sobre liberdade de manifestação e que há menos de dois anos era nada menos do que advogado do agora afastado presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
De muitas maneiras é uma afronta ao país que praticamente não saiu das ruas desde as históricas manifestações de junho de 2013. O novo ocupante do Planalto sequer pensou na repercussão negativa da escolha apenas de homens para o primeiro escalão que substitui o escolhido pela primeira presidenta eleita do Brasil e apenas meses depois de o país assistir a massivas mobilizações de mulheres nas ruas e nas redes sociais.
Fica cristalina a incoerência e a moral dupla ao nomear implicados em investigações contra a corrupção. O presidente interino fala em "proteger" a Lava Jato, mas acaba de dar foro privilegiado - o prerrogativa de ser julgado apenas pelo Supremo Tribunal Federal - a um ministro. Ele devolveu ao ministério outro investigado que havia deixado o gabinete de Dilma. Não concordo que ser julgado pelo STF equivale a imunidade, mas era isso ao menos que diziam os milhares que foram às ruas protestar contra a indicação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por Dilma Rousseff em março.
A nomeação de Lula acabou paralisada no Supremo e evidencia a faceta mais perigosa da crise brasileira, que evoluiu de política a institucional. O impasse sobre Lula se deu por uma decisão individual do ministro Gilmar Mendes, que tampouco parece incomodado com simbolismos e liturgia do cargo. Mendes e seu colega, José Antonio Dias Toffolli, receberam nesta quinta o presidente em exercício em cerimônia no Tribunal Superior Eleitoral. Toffolli, um ex-advogado do PT indicado por Dilma para a Corte, declarou que Temer estava legitimado e, curiosamente para um magistrado, considerou apenas um formalismo incluir a palavra “interino”. Mendes, por sua vez, usou o evento para mais uma diatribe contra o PT.
Ocorre que está nas mãos desse tribunal um caso que pode ser decisivo na crise. É o TSE quem julga a ação que pede a cassação da chapa eleita em 2014 - Dilma/Temer - por suposto abuso de poder e uso de dinheiro desviado do esquema da Petrobras na campanha. O Ministério Público é enfático ao dizer que a trama de corrupção tinha o PT e o PMDB como os dois eixos de condução principais. Mendes, no entanto, não perde a oportunidade de afirmar que, sim, o tribunal pode avaliar excluir Temer da ação e livrá-lo da cassação - que levaria a novas eleições -, mesmo contrariando a jurisprudência usual. A preocupação em torno da contaminação política do Judiciário não é à toa e, para piorar, vai muito além da falta de recato de Mendes. Foi o comportamento errático dos magistrados, com “inovações” jurídicas e timing questionável, que permitiu inclui-los sob o mesmo manto de desconfiança que já abarca os outros Poderes.
Parece perigoso o aparente descolamento não só do novo Governo interino como também de parte do Supremo em relação ao Brasil real e complexo fora de Brasília e das marchas contra a corrupção homogêneas, decoradas com "ordem e o progresso" das bandeiras. Lastro nos setores econômicos influentes e no Congresso podem não ser suficientes para construir uma gestão convincente. As redes sociais sinalizam um mal estar palpável desde a inglória sessão da Câmara dos Deputados que votou o impeachment de Dilma. Não são um indicativo a ser desconsiderado. O apoio popular à destituição da petista, que ainda passará por uma última fase no Senado, vinha caindo e não voltou a ser aferida em pesquisas de opinião depois de 17 de abril. O próximo levantamento que vier a público será um termômetro crucial para os novos ocupantes do Planalto. A Temer, que diz não estar familiarizado com o WhatsApp, é preciso alertar que estamos no Brasil do século 21, onde nem mesmo os telejornais têm preponderância inquestionável sobre a formação da opinião pública.
Fonte: El País

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