Educaçâo

Professores aprendem a abordar temática em cursos de formação


Há dez anos, a legislação brasileira determina como obrigatória a inserção das relações etnorraciais nos currículos da educação brasileira. Cursos de formação continuada oferecidos pelas redes de educação de estados e municípios ajudam os professores da educação básica a elaborar projetos criativos sobre o tema.

“O preconceito morre com o conhecimento, que gera frutos belíssimos em sala de aula, a começar com o nascimento da tolerância”, ensina a professora Fátima de Castro, que leciona artes na Unidade de Educação Básica Rubem Teixeira Goulart, em São Luís, Maranhão. Há três anos, ela inclui estudantes do sétimo ao nono ano do ensino fundamental no projeto pedagógico Cultura Afro-brasileira na Sala de Aula. São ações multidisciplinares que envolvem, principalmente, pesquisas. 

A inserção do ensino de história e da cultura afro-brasileira e africana na grade curricular da escola começou em 2005, com a formação continuada para professores e gestores. A diretora, Ana Célia Peixoto Lopes, fez o curso e passou a orientar os professores quanto à importância de destacar as questões etnorraciais em sala de aula. 

“Tínhamos dificuldades na gestão de sala de aula por problemas de preconceito entre os alunos”, afirma. “Isso acabou quando os próprios alunos foram estimulados a buscar informações. Hoje, não precisamos mais impor respeito entre eles.”

Visita — A transformação na escola começou com a visita a uma comunidade quilombola no povoado de Filipa, na zona rural de Itapecuru-Mirim, a cerca de duas horas da capital maranhense. Formada há mais de cem anos, a comunidade tem ruas de terra batida, casas de taipa com telhado de palha e mantém a tradição do tambor de crioula, dança de origem africana em louvor a São Benedito. Os descendentes dos escravos sobrevivem da pesca e da produção artesanal de farinha de mandioca.

O Centro de Cultura Negra do Maranhão calcula em 527 as comunidades quilombolas no estado. “Os alunos foram até o quilombo da Filipa, e os moradores de lá visitaram a escola para ensinar a técnica de fazer sabonetes de babaçu”, conta a diretora. A oficina e as histórias de luta da comunidade quilombola sensibilizaram os alunos. “Essa aproximação trouxe conhecimento e gerou respeito, pondo fim ao preconceito.” 

Legislação — O curso de formação para a rede pública municipal em São Luís foi ministrado à época por Ilma Fátima de Jesus, hoje coordenadora-geral de educação para as relações étnico-raciais do Ministério da Educação. Segundo ela, os cursos de formação continuada são importantes e devem ser cumpridos pelas redes de ensino, em conformidade com a legislação brasileira. A Lei nº 10.639, de 9 de janeiro 2003, e a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educacional Nacional) tornam obrigatória a inclusão no currículo da educação básica da temática da história e da cultura afro-brasileira. 

“À época em que muitos professores da educação básica se formaram não havia orientação para a inserção de conteúdo afro-brasileiro nas diretrizes curriculares. Atualmente, as universidades devem incluir essas questões nos cursos de formação de professores”, explica a professora. Segundo Ilma, os cursos de formação continuada ajudam a discutir agendas para melhorar a educação.

No curso, são traçadas estratégias para tornar as aulas mais interessantes para os alunos. “É preciso leva informação para a sala de aula, e há muito desconhecimento da contribuição africana na formação da nossa identidade, da exclusão dos negros, da contribuição de vários escritos negros para a literatura”, exemplifica Ilma. Em 2010, ela publicou o livro Educação das Relações Étnico-Raciais, que reúne sugestões de abordagens dessa temática para os anos iniciais e finais do ensino fundamental. A publicação contém textos, imagens, atividades, glossário e sugestões de livros, filmes, músicas e sites para os professores.

Origens — Em 2011, a professora Fátima, apaixonada pela temática, foi convidada a fazer palestra em Brasília sobre projeto cultural afro-brasileiro na 1ª Conferência Nacional do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor) do Ministério da Educação. “Não sou descendente de africanos, mas tenho identificação com as cores, os adereços, com a cultura afro”, diz Fátima, que já visitou o Museu AfroBrasil, no Parque do Ibirapuera, em São Paulo. “Quero levar mais conhecimentos sobre nossas origens africanas para a sala de aula”, diz. “Todos nós herdamos muito. Todos têm pilão, peneira em casa. Isso é cultura incorporada.”

O Museu AfroBrasil, fundado em 2004, é visitado por professores de escolas públicas de todo o país. A cada ano, em outubro, é oferecido curso gratuito para docentes. “É um museu de história da afro-brasilidade. Ele resgata todo esse conhecimento que ficou na atmosfera brasileira, nas artes, na memória e na história”, diz o diretor, Emanoel Araújo. 

Segundo Araújo, o museu ajuda os professores a descobrir momentos da história do Brasil que não estão em livros e que foram importantes para a formação da identidade nacional. Ele cita, por exemplo, a participação dos negros na Guerra do Paraguai [1864-1870], na expulsão dos holandeses [século 17], e na Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo. 

“Ainda há muita desinformação, e muitos professores saem daqui impressionados porque descobrem que há muito o que estudar”, afirma a pedagoga e antropóloga Ana Lúcia Lopes, coordenadora curatorial da instituição. “O museu oferece essa visão ao mudar a chave de leitura da história do Brasil.”

“O desconhecimento dessa riqueza histórica é o que consolida o preconceito e a discriminação”, conclui a professora Fátima. 

Rovênia Amorim

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