O 180graus recebeu na tarde desta segunda-feira (24/08) a visita do advogado Chico Lucas, candidato à presidência da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Piauí, que aparece como a terceira via no pleito que tem ainda nomes como Sigifroi Moreno e Celso Barros na disputa. Pelo menos por enquanto.
Ele critica ainda a falta de apoio dentro das comissões e diz que a Ordem trabalha para não interferir os interesses de clientes dos dirigentes. “Nós que somos mais jovens, entramos com um sonho de trabalhar em prol da OAB, mas somos barrados pela falta de estrutura e de autonomia”, diz.
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Rômulo Rocha - Vamos começar pela atual conjuntura da OAB, pegando pela Eduarda Miranda, a sua leitura desta saída, deste movimento... Como o senhor avalia essa ida dela para o grupo da oposição?
Chico Lucas - Ela, por ser a segunda pessoa na escala hierárquica, sangrou a situação de morte, mostrou que todas as críticas que vinham sendo feitas eram reais e uma pessoa do alto escalão reconheceu, e saiu do grupo. Entretanto, acho que independente da questão de gênero, acho que ela pecou pela falta de coerência. Ela não se reservou e foi para o lado da oposição, mudou muito radicalmente em muito pouco tempo.
RR - Além dela sair, ela já escolheu um grupo para ir…
CL - Outro grupo que já havia sido apeado do poder, por praticar aquilo que hoje a situação é acusada de fazer, que é a falta de alternância, a falta de democracia. Eu acho que ela perdeu, quando não teve coragem de assumir uma posição mais vanguardista, mais autônoma. Quando ela foi recebida com um certo carnaval, acho que trouxe prejuízo à imagem dos grupos. Mostrou que os dois são muito parecidos, e que tudo se trata apenas de uma briga por poder.
RR - Essa história de que ela pode ser candidata, no grupo atual da oposição, ligada ao Dr Celso Barros, procede?
CL - O que nós ouvimos falar é que o grupo da oposição hoje está rachado, existem três candidatos. Dr. Celso, Dra. Eduarda, que vem como uma presidenciável, e o Dr. Fábio Veloso também lançou o seu nome. Não sei como eles vão achar uma equação que transforme três em um, sem fazer desta escolha, algo conflituoso.
RR - Publicamos uma nota no blog Bastidores, falando sobre uma crítica, sua, em relação ao funcionamento das 53 comissões dentro da ordem. Engraçado é que existiram algumas críticas dizendo que ‘ele não devia falar isso, porque é membro de uma comissão’. Como o senhor recebeu esta crítica?
CL - É verdade que faço parte de comissão, tenho o maior orgulho. Acho que quem trabalha nas comissões faz um trabalho valoroso, até porque é um trabalho voluntário. A crítica que foi feita, e a Dra. Eduarda como coordenadora das comissões mostrou que a nossa crítica tinha fundamento, que é a falta de estrutura e autonomia. Nós que somos mais jovens, entramos com um sonho de trabalhar em prol da OAB, mas somos barrados pela falta de estrutura e de autonomia. Levamos pleitos à diretoria, que nos cala. Ela não quer que as comissões trabalhem adequadamente, pois pode trazer prejuízos à Ordem, ou aos clientes dos dirigentes da Ordem, aos poderes constituídos.
RR - Só um minutinho, o senhor está me afirmando que dentro da OAB a própria instituição não quer que as comissões trabalhem de forma correta e íntegra, por que pode prejudicar clientes?
CL - Eventualmente, sim. A Comissão de Fiscalização dos Atos Públicos. Será que a OAB quer que esta comissão seja fortalecida? Que tenha autonomia para fiscalizar os atos dos poderes executivos? Quando o nosso presidente era advogado do governador, advogado do presidente da Assembleia, como é que ele pode ter autonomia e permitir que essa comissão tenha autonomia? Não é algo contra os membros, que são pessoas de valor. Como membro da Comissão de Regularização Fundiária, fizemos uma cartilha com instruções e que será impressa por uma empresa alheia, porque a OAB disse que não tinha dinheiro para imprimir uma cartilha, enquanto vemos diversas outras coisas serem feitas que não são em benefício da advogacia.
RR - Essas caravanas?
CL - Essas caravanas são usadas de forma eleitoreira. Levando pessoas para o interior sem motivo aparente. Sequer pessoas que são jovens advogados, para palestrar, para falar a advogados do interior. Mas estamos felizes porque as pessoas têm percebido este uso e estão deixando de comparecer a estas caravanas.
RR - Me explique aqui, a questão da arrecadação da OAB, o que compõe esta arrecadação?
CL - São as anuidades e os valores recolhidos das custas.
RR - Chega a quanto?
CL - Estas informações hoje não são transparentes. Acho que na OAB a gente poderia reproduzir aquilo que é exigido para os órgãos públicos e disponibilizar na internet os dados para que os advogados tenham acesso a todas as despesas.
RR - Quer dizer que se eu entrar no site da OAB não vou conseguir achar a arrecadação da OAB através de custas e dos honorários?
CL - Você vai encontrar um balancete, com informações resumidas. Um balancete, eu não tenho conhecimento suficientemente contábil para interpretar, assim como a maioria dos advogados. Acho que na página da OAB deveríamos ter os links das despesas com comprovantes, tinha de ser vanguardista neste ponto, como a mais limpa e mais transparente do Brasil, para poder cobrar dos outros poderes.
RR - Que nota o senhor daria para a transparência da OAB hoje?
CL - Eu daria 2, de zero a 10.
RR - Há algum ponto emblemático? A saída da presidente da Coordenação das Comissões já representa muito. O senhor como membro, até mesmo do que ouviu dos seus colegas, acha que há algo mais emblemático do que a simples saída?
CL - Acho que o que é mais emblemático e que as pessoas hoje percebem, é que a OAB é hoje um trampolim para projetos pessoais. Ou seja, o advogado que hoje busca e dirige a ordem. Hoje se busca apenas ocupar espaços, no quinto constitucional, no TRE. Nós temos um pequeno grupo mantendo uma relação de subserviência com o poder judiciário, para tirar fruto e tirar louros, em detrimento da grande massa que está hoje desassistida pela justiça. Pagamos caro por uma justiça de péssima qualidade.
RR - Sobre a comissão do Dr. Sigifroi, que tem uma relação direta com o judiciário, o senhor tem alguma crítica a fazer?
CL - Ele é presidente da Comissão de Relacionamento com o Judiciário. Acho é que ele seria a pessoa ideal para estabelecer esse link com o poder judiciário, em prol da advogacia. Acho que com boa vontade conseguiríamos estabelecer uma advocacia em dois turnos, já que hoje temos uma justiça funcionando em um turno só, que é morosa e é cara. Representa que o trabalho à frente da Comissão de Relacionamento com o Judiciário não foi um bom. Não enxergou as dificuldades que hoje os advogados enfrentam.
RR - E o que precisa para a justiça funcionar durante os dois turnos?
CL - Lógico que temos a questão de orçamento, mas acho que se houvesse mais boa vontade por parte do tribunal encontraríamos uma solução adequada. A falta de dinheiro não pode ser um escudo. Devemos ser criativos e inteligentes para trabalhar em uma situação de escassez.
RR - O senhor falou de pontes entre membros da atual administração e as escalas superiores, poderes executivo e legislativo, respectivos clientes… ou seja, realmente na questão da estrutura do poder judiciário, galgando cargos. Eu queria que o senhor enumerasse quem estaria onde, quem foi por qual motivo, quais são os nomes que conseguiram ascender desta atual gestão.
CL - A escolha do quinto constitucional, ela não é transparente, o ex-conselheiro Dr. Cássio foi para o TRF, nosso colega Dr. Norberto está no CNJ, ou seja, porque apenas pessoas que fazem parte daquele grupo poderiam bem representar a advocacia do Piauí. Quer dizer que os outros advogados que não estão no poder, que não fazem parte da diretoria não poderiam representar o Piauí? É sinal de que a OAB está servindo a um grupo, e não à advocacia. No quinto constitucional, a OAB tem um papel importante, primeiro há uma votação para a escolha dos doze nomes, depois a seccional define seis nomes. Em seguida o tribunal reduz para três, depois vem a escolha do governador e da presidente da República. Mas nas outras instituições tem sido instaurado um processo mais democrático, onde os mais votados figuram nas listas tríplices, com a defesa para que o nome mais votado seja escolhido.
RR - Aqui não está funcionando assim…?
CL - Infelizmente não. É o grupo que está no poder que tem decidido e trabalhado em prol de um nome. O primeiro colocado nas votações é quem deveria ser o nome defendido pela ordem, pois ele teria a representatividade de um maior número de advogados.
RR - Quem mais o senhor citaria que conseguiu galgar esses espaços?
CL - Olha, eu não tenho nomes. Mas nós temos outros exemplos de advogados, o Dr. Mário Roberto figurou na lista tríplice para o STJ, mas eu não tenho certeza até…
RR - Seria errado, na percepção daquele advogado mais jovem, de que eles têm a chance de galgar mais espaço do que aqueles fora da diretoria da Ordem?
CL - Sim, quem está no comando tem hoje tem as portas abertas.
RR - O que o senhor mudaria como presidente, já que o senhor tem aí uma pretensa candidatura…
CL - Nós elaboramos uma reforma política com 10 pontos, que pedem transparência nas despesas, nos gastos de campanha, mostram que na nossa gestão a OAB vai ser mais transparente. Nós defendemos o limite de mandatos, para qualquer cargo, e só vai ter direito a uma reeleição, o que vai permitir a renovação.
RR - O senhor é pré-candidato, e existe toda uma vedação em se falar de candidatura antes do período deflagrado…
CL - Até queria fazer um comentário sobre isso. Este pleito não acontece de forma democrática. Hoje o grupo que está no poder controla as eleições, controla datas, fazem eventos camuflados, usam a máquina, e isso para mim mostra que a OAB não é democrática. Um pequeno grupo usa toda estrutura para fazer campanha pelo interior, enquanto os outros não podem falar porque seria propaganda extemporânea. Todos os advogados são pessoas conscientes, esta questão de propaganda deve ser objeto de resolução da OAB. Tínhamos que ser mais abertos para não haver favorecimento.
RR - O senhor é o candidato da terceira via? O senhor sai como candidato?
CL - Grupo da renovação. Eu só serei candidato se for por esse grupo. Não tenho intenções e não me filiarei a outro grupo, até porque se eu fizesse isso eu seria incoerente. Acho que um advogado tem que primar pela coerência. E sendo advogado, eu não concordo com nenhum dos outros grupos, e junto com outras pessoas que também acreditam na mudança.
RR - O senhor foi sondado por algum grupo de situação e oposição pra…?
CL - Os dois grupos, me ofereceram cargos, posições na vice-presidência. Os dois grupos ofereceram a vice-presidência.
RR - Quem falou?
CL - Pessoas do grupo, o próprio grupo ofereceu, fui sondado, procurado.
RR - E os dois grupos ofereceram a vice-presidência numa chapa?
CL - Só que nós refutamos, porque não estamos aqui buscando espaço ou poder. Buscamos mostrar um caminho que é alternativo, mais democrático, aberto, em que as pessoas não estejam procurando espaço de poder ou projeção pessoal.
RR - O senhor falou em uma comissão de combate à corrupção…
CL - De Fiscalização e Controle. Acho que hoje a OAB peca em não fiscalizar a corrupção. Você e o 180graus fazem um trabalho fantástico fiscalizando os atos e nós não temos uma OAB forte neste sentido. Mas é a OAB de modo geral. Hoje a Ordem é dominada pelos advogados eleitoralistas, todos os diretores basicamente. Dr. William, Dr. Norberto, Dr. Marcos Vinicius, Dra. Georgia, Dr. Daniel Oliveira… E como eles são eleitoralistas, advogam para o poder público.
RR - Então são eles quem tem grande parte do poder em atuação, por exemplo, dos atuais mandatários…
CL - Isso, eu acho que eles acabam interferindo na postura da Ordem, que deixa de ser independente.
RR - Passaria então a ser um apêndice do poder público, a Ordem?
CL - Em alguns momentos pareceu um apêndice. Não quero dizer que é, mas ela pareceu. Em alguns momentos serviu ao poder constituído. A OAB hoje deixou de ter um papel contestador na sociedade.
RR - E como a classe mais jovem tem recebido este discurso?
CL - Nós temos tido um apoio muito bom. Todos estão sofrendo, mas os com menos de 5 anos [advogados] estão sofrendo muito mais. Hoje a pessoa se sente totalmente desestimulada em enveredar pela advocacia. Ela não consegue sobreviver do seu trabalho. A OAB só tem visto projetos pessoais. Por isso nosso discurso tem sido acolhido. Acho que os advogados são as vozes da República. Se ele não grita, não fala, infelizmente vai deixar passar em branco seu dever cívico.
RR - O senhor defende a realização de concurso público nos municípios para escolha de procuradores, qual sua posição sobre isso?
CL - Eu acho que o concurso público é o melhor caminho sempre para ter todos os advogados em condição de igualdade, e eu sou a favor do concurso até porque temos uma massa de advogados precisando de uma oportunidade. Entretanto eu vejo que, em alguns municípios, até mesmo para não ser radical, não tem condição de ter uma procuradoria.
RR - Duas últimas perguntas. O seu ponto mais forte?
CL - Acho que a independência, mostrar que como presidente vamos adotar uma postura independente, não só em relação aos poderes, mas em relação aos projetos pessoais. A nossa agremiação é formada por pessoas jovens e envolvidas por um ideal, que querem ver uma justiça mais limpa, mais célere e mais harmônica, o que faz com que a gente não tenha medo de assumir uma postura mais contestadora. Além disso nossa proposta engloba a proibição do presidente, assim como no caso do governador e presidente, de se candidatar na eleição seguinte. Meu compromisso, é quando terminar meu mandato, não ser candidato a nenhum cargo. Por quê? Vou trabalhar em prol da dignificação da minha categoria e da minha história.
RR - E o seu ponto mais fraco, para encerrar...
CL - Olha, o pessoal coloca a minha pouca idade. Só que eu digo o seguinte, se o meu defeito é a pouca idade, é um defeito que o tempo vai curar.
Fonte: 180graus
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